“Quero ser Médico” é um livro com uma linguagem simples e acessível a todos, ideal para quem quer seguir medicina e ainda não sabe bem o que vai encontrar ou o que têm que fazer para lá chegar. Para além das especificidades do mundo médico, João Magalhães (JM) dá alguns conselhos de organização do estudo para que os alunos facilmente atinjam os seus objetivos.

FE: Como surgiu a ideia deste livro?

JM: Em meados de 2007, no final do meu segundo ano de curso, o meu irmão mais velho, depois de já ter concluído uma licenciatura em bioquímica, de ter estado um ano a trabalhar numa empresa de consultoria em Lisboa, e de ter estado mais um ano a trabalhar ao serviço da fundação Clinton em Maputo, chegou a Portugal e deu-nos (a mim e à família) a notícia que tinha decidido mudar de rumo, e que se ia candidatar a medicina.

Uns escassos meses a seguir, uma prima minha que já tinha terminado o curso de gestão, e que tinha estado vários meses a realizar voluntariado na fundação Madre Teresa de Calcutá, na Índia, voltou de lá com uma grande vontade em candidatar-se a Medicina, e veio-me pedir uma opinião para a ajudar na sua escolha. “Achas que tenho perfil? Achas que devia tentar? Achas que vou gostar?”

Como os conhecia bem e sabia que tinham os dois uma forte componente humana, incentivei ambos a seguir em frente com as suas candidaturas. E assim fizeram os dois. O meu irmão mais velho realizou o curso com grande motivação e terminou o curso este ano. Apesar da minha prima não ter ficado colocada, o fato é que ficou de consciência tranquila por ainda ter tentado.

joão magalhães
No entanto, os conselhos e dicas que dei não ficaram apenas por aí. No início do meu quinto ano de curso, um casal amigo dos meus pais, pediu-me para ter uma conversa com um dos seus filhos, que estava prestes a iniciar o décimo ano, mas não sabia bem se era Medicina que queria.

Passado meio ano, pouco tempo antes de casar e partir de Erasmus para Berlim, voltei a encontrar uma situação bastante semelhante, dessa vez com um rapaz que já estava certo que queria Medicina, mas que queria que eu partilhasse com ele algumas dicas importantes para ter boas notas. Foi nessa tarde, a meio do meu quinto ano, que o meu cérebro começou a moer lentamente: “Ei espera aí” “Será que isto não é coincidência a mais? “Tantas pessoas diferentes, a virem pedir conselhos, de idades tão diferentes e de áreas tão distintas?”...

A decisão propriamente dita acabou por ser numa viagem de metro nos arredores de Berlim. De repente, lembro-me de perguntar a mim próprio: “Porque é que não começas a escrever um livro?”

Nessa noite, deitei-me com a cabeça a explodir de ideias. A certa altura, após várias horas a revirar na cama, apercebi-me que não estava a ter muito sucesso a adormecer. Acabei por me levantar, pegar numa caneta e num papel, e anotar tudo até desfazer por completo essa tempestade cerebral.


FE: Que principais dificuldades encontrou no acesso à profissão de médico?

JM: Para além das dificuldades mais triviais, encontrei três grandes obstáculos no acesso à profissão de médico:

- Adaptação ao ensino português:

Nasci em Inglaterra, onde vivi e estudei até aos 10 anos; aos 14 anos estive um ano a viver no Chimoio, no coração de Moçambique (durante o qual estive a estudar num colégio no Zimbabwe). Regressado a Portugal, ainda estive a estudar no colégio inglês até ao nono ano. No décimo ano, a minha mudança e adaptação para o ensino português, acabou por não ser tão fácil como estar deitado na praia a beber um iogurte. Isto não significa que tenha sido extremamente difícil, mas apenas que precisei de mais tempo do que esperava.

Sabendo que o sistema de ensino britânico é obviamente distinto do português, para conseguir obter as notas de excelência necessárias para entrar em Medicina (acima dos 17-18 valores) tive de aprender a estar atento a pormenores diferentes aos quais estava habituado. A meio do meu décimo ano, visto que a minha média era de 16 valores, e tal tornava o meu objetivo muito mais difícil e distante, no final do ano letivo, acabei por decidir faltar às provas globais para poder repetir o décimo ano outra vez. No segundo ano em que repeti o décimo, já estava bastante mais adaptado ao ensino português e obtive classificações bastante melhores.

Brain exercising

- Distração e excesso de confiança no exame nacional de química:

As provas de ingresso para as Faculdades de Medicina, também conhecidas como “as específicas”, têm um peso muito grande na nota de candidatura ao ensino superior (50%). Dito isto, qualquer distração pode ser decisiva no resultado que é obtido. No 12º ano, após já ter realizado a prova de biologia que me tinha corrido bem, no exame de química cometi um erro crasso: esqueci-me do relógio em casa. Para além disso, fui para o exame “confiante de mais” e acabei por me esquecer de controlar minimamente o tempo que ainda tinha disponível. Realizei o exame com calma, mas quando o tempo da prova terminou, ainda me faltavam duas questões por responder! Resultado: Não obtive uma nota de candidatura suficientemente alta para entrar em Medicina, e tive de ficar mais um ano a estudar e a ter explicações para repetir as provas de ingresso.

- Ultrapassar os “cadeirões” do curso.

Apesar de nunca ter reprovado a nenhuma cadeira na faculdade (talvez por ter recebido avisos suficientes de amigos e colegas mais velhos), recordo-me que os “cadeirões” do curso foram autênticos obstáculos pelo facto de ter sido necessário dedicar muitas horas a decorar inúmeros nomes e conceitos novos. Alguns exemplos de “cadeirões” no curso de Medicina são: Anatomia, Histologia, Anatomia Patológica, Microbiologia, Farmacologia, entre outros. Tirar o curso de Medicina é equivalente a aprender várias línguas totalmente distintas. É importante ter bastante força de vontade e disponibilidade mental para apreender tanta informação nova.

FE: Que tipo de conteúdos e conselhos dá neste livro?

JM: Neste livro, partilho conteúdos e conselhos que estão divididos entre os três capítulos principais: 1 - Porquê Medicina? A decisão; 2 - Como entrar em Medicina; 3- O curso de Medicina.

quero ser médic capaNa primeira parte do livro começo por apresentar os conceitos fundamentais da Medicina e contar como a Medicina evoluiu até aos dias de hoje. De seguida, apresento quais os pontos mais atrativos e quais as dúvidas mais comuns relativamente ao curso e à profissão médica. Esta parte também ajuda os mais indecisos a tomar uma decisão sobre o seu futuro.

Na segunda parte do livro, dou as dicas mais fundamentais para entrar em Medicina (ou qualquer outro curso com nota de acesso alta). Dou dicas sobre todos os pontos mais importantes, desde a escola e as aulas, ao estudo e às avaliações. Dou as dicas de modo a que os alunos nunca deixem de ter tempo para realizar outras atividades que também gostam. Esta parte também inclui algumas mensagens para os pais dos alunos.

Na terceira e última parte do livro explico a estrutura e conteúdo geral do curso de Medicina no nosso país, as suas características principais e também partilho algumas dicas importantes para realizar o curso com sucesso. O livro acaba a informar sobre as possibilidades de estudar medicina no estrangeiro e sobre o que acontece depois de terminares o curso.

Ao todo, existe um total de 28 dicas concretas ao longo do livro. Para além de todas essas dicas, uma das grandes vantagens do livro é o facto de reunir uma série de outras ferramentas e informações importantes: formas de acesso ao ensino superior, peso de cada avalição na nota de candidatura, rankings das melhores escolas, notas de acesso e vagas das faculdades de Medicina, websites úteis, entre muitas outras.


medico

FE: Qual a importância deste livro para os futuros médicos?

JM: Este livro serve como uma ferramenta extremamente útil a todos os estudantes que aspiram à profissão médica.

Tanto previne contra as fantasias que alguns possam ter sobre a profissão, como aprofunda as características mais essenciais para se ser um bom médico: empatia, altruísmo, e um forte sentido de serviço. O livro também serve para ajudar todos os alunos que possam ter dúvidas sobre o seu percurso no futuro. No entanto, o livro também é extremamente útil para qualquer aluno que queira obter boas notas, na medida em que aconselha, ao pormenor, como cumprir um plano de estudo no Secundário, que permita alcançar as classificações elevadas que são necessárias.

FE: Se não tivesse seguido a medicina, que outra profissão gostaria de ter seguido? Porquê?

JM: Eu costumo dizer que é uma pena não podermos ter várias vidas e escolher uma profissão diferente em cada uma delas. Se pudesse ter várias vidas, penso que nas próximas gostaria de ser ator, diretor cinematográfico, ou político.

Admiro o cinema e a representação pelo forte potencial que apresentam em transmitir valores e prioridades importantes para uma vida em paz e em comunhão com os outros. Através do vídeo e do cinema, torna-se possível contar histórias que transmitem a importância de inúmeros valores e sentimentos positivos: sentimentos de união, irmandade e fraternidade.

Também tenho um grande fascínio pela política. Isto por acreditar que ela corresponde nada mais, nada menos, à medicina em larga escala: procura alcançar o maior bem para o maior número de pessoas.

FE: No seu livro, dá alguns conselhos para quem quer ser médico. Há alguma razão para não ser médico?

JM: Sim. Basta uma pessoa sentir que não gosta de trabalhar com um sentimento de serviço perante os outros. Isso já é uma razão forte para não se escolher ser médico. Qualquer profissão que não tenha como finalidade servir os outros, ou seja, que não tenha como principal objetivo melhorar a qualidade de vida (ou enriquecer a experiência de vida) dos restantes membros da sociedade, nem sequer deveria existir.