O que o traz a Castro Marim, tão longe de Barcelos?  

Querem ver que um galo maior e vacinado tem de dar justificações? Estou de férias. Eu sou um símbolo nacional, meus caros – nacional! Posso passar férias onde quiser. Mas, enfim, compreende-se que me imaginem quietinho em Barcelos, que é a minha cidade natal e o cenário onde se passa a minha lenda. 


E que lenda é essa?  

É uma coisa assim meio romance policial – mete um crime misterioso, um rapaz galego acusado injustamente e eu, Galo de Barcelos, que ao cantar acabei por salvar o dito jovem. Sou assim uma espécie de Shercock Holmes, estão a ver? (risos) A partir daí, na década de 1930, um oleiro da região chamado Domingos Côto terá criado a primeira figura do Galo de Barcelos. 

 

 


[A minha lenda] é uma coisa assim meio romance policial – mete um crime misterioso, um rapaz galego acusado injustamente e eu, Galo de Barcelos, que ao cantar acabei por salvar o dito jovem. Sou assim uma espécie de Shercock Holmes, estão a ver? (risos)


 

 


Entretanto, torna-se um símbolo nacional…
 

Sim, nas décadas de 50 e 60, o Estado Novo acaba por achar graça à ideia de me destacar enquanto símbolo político, cultural e folclórico, nomeadamente ligado ao turismo. Depois de terminada a ditadura, acabei por, felizmente, ser mais associado à liberdade. Acaba por ser uma história com um final feliz. E pensar que tudo começou comigo a cantar… As pessoas normalmente não apreciam muito um galo que cante [silêncio]. 


Sentimos alguma mágoa nessas palavras. Porquê?
 

Acho que há um claro preconceito aviário em Portugal. Um guarda-redes falha? Deu um “frango”. Alguém bate com a cabeça? Tem um “galo”. Uma mãe é demasiado protetora? É “mãe-galinha”. Alguém é desagradável? É uma “ave rara”. Estás a ficar doente? Estás a “chocar” alguma coisa. Podia continuar o resto do dia a dar-vos exemplos. Na verdade, é tudo muito simples. Parece que as pessoas só se lembram que as aves têm coração para fazer arroz de miúdos.